Trump critica Europa e dá vantagem diplomática à Rússia em negociações


Os negociadores do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao Kremlin podem ter girado em círculos durante as conversações da semana passada em Moscou sobre um possível acordo de paz para a Ucrânia, mas os russos agora podem pressionar com uma nova vantagem: o aprofundamento das divisões entre Washington e Europa.

Na terça-feira (9), Trump reforçou as críticas de sua administração à Europa, afirmando que as nações europeias eram “fracas” e “decadentes” devido às suas políticas de imigração em entrevista ao jornal Político.

Ele também argumentou que a Moscou tem “vantagem” em sua guerra contra a Ucrânia e que era hora do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky “começar a aceitar as coisas” quando se trata de esforços para encerrar o conflito.

“Ele vai ter que tomar uma atitude e começar a aceitar as coisas, sabe, quando você está perdendo”, disse Trump.

 

Nova estratégia de segurança nacional

As declarações do presidente americano seguiram-se à divulgação, na semana passada, de uma nova estratégia de segurança nacional que criticava duramente os governos europeus por seu apoio à Ucrânia, culpando “autoridades europeias que mantêm expectativas irrealistas sobre a guerra” por obstaculizarem um acordo de paz.

“Uma grande maioria europeia quer paz, mas esse desejo não se traduz em política, em grande parte devido à subversão dos processos democráticos por parte desses governos”, afirma o documento.

O chanceler alemão Friedrich Merz rebateu esse documento estratégico, dizendo em uma coletiva de imprensa que “parte dele é compreensível, parte é entendível, e parte é inaceitável para nós da perspectiva europeia”, acrescentando que as nações europeias não precisam de ajuda dos Estados Unidos para “salvar a democracia” na Europa.

Mas a formulação da administração Trump – retratando a Europa como um obstáculo antidemocrático para relações estáveis com a Rússia – tem sido uma dádiva para Moscou.

Reação do Kremlin

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, saudou a divulgação do documento, dizendo no domingo que ele era “consistente com nossa visão”.

Em declarações na segunda-feira (8), Peskov elaborou ainda mais, dizendo: “O aspecto que vemos no novo conceito certamente nos agrada. Ele fala da necessidade de diálogo e da construção de relações construtivas e boas”.

Kirill Dmitriev, CEO do Fundo Russo de Investimento Direto e um intermediário-chave nas recentes trocas diplomáticas entre Washington e o Kremlin, também aproveitou o momento.

Em uma série de publicações no X, Dmitriev celebrou as críticas de Trump aos países europeus, particularmente a advertência de que a “Europa precisa ser muito cuidadosa” e que “está tomando algumas direções ruins… muito ruins para o povo.”

As declarações de Trump foram em resposta a uma pergunta sobre a multa de US$ 140 milhões aplicada pelos reguladores da UE ao X na sexta-feira (5) por violar as regras europeias de conteúdo online.

Elon Musk, proprietário do X, respondeu com publicações pedindo a abolição da UE.

No entanto, é contraditório que autoridades russas amplifiquem as acusações da administração Trump sobre o retrocesso democrático na Europa: o presidente russo Vladimir Putin praticamente eliminou a competição política e extinguiu a liberdade de imprensa ao longo de um quarto de século no poder.

Além disso, a Rússia efetivamente bloqueia o acesso a redes sociais como Facebook e X, embora isso não impeça que autoridades russas bem conectadas como Dmitriev utilizem essas plataformas tecnológicas para difundir seus posicionamentos.

Estratégia russa

A política russa tem sido claramente direcionada a enfraquecer o apoio europeu à Ucrânia, enquanto aproveita a oportunidade para semear dúvidas sobre a viabilidade da aliança Otan. E a nova estratégia de segurança nacional da administração Trump fornece mais munição a Moscou em uma guerra de informação destinada a influenciar a opinião pública tanto nos Estados Unidos quanto na Europa.

Já vimos isso antes: a repercussão na Europa sobre a divulgação da nova estratégia de segurança nacional da administração Trump se assemelha ao choque sentido pelos europeus após o discurso do vice-presidente dos EUA, JD Vance, na Conferência de Segurança de Munique em fevereiro.

O presidente ucraniano tem feito uma série de visitas pela Europa esta semana, conferindo com os líderes do Reino Unido, França e Alemanha em Londres e reunindo-se com autoridades da Otan e da União Europeia em Bruxelas para fortalecer o apoio à Ucrânia.

Paralelamente, as mensagens e advertências russas direcionadas à Europa têm aumentado em volume.

Em entrevista à televisão estatal russa, o linha-dura cientista político Sergey Karaganov afirmou que a Rússia está “em guerra com a Europa, não com uma Ucrânia miserável, lamentável e mal orientada.”

Karaganov acrescentou que, por não falar em nome de Putin, pode dar sua opinião sem filtros: “Esta guerra não terminará até destruirmos a Europa, moral e politicamente.”

Mesmo que Karaganov não estivesse falando em nome do governo russo, ficou claro que ele estava ecoando ameaças feitas pelo próprio Putin.

Às vésperas de seu encontro com o enviado especial de Trump, Steve Witkoff, e seu genro Jared Kushner em Moscou na semana passada, o líder russo advertiu que a Rússia está “pronta agora mesmo” para uma guerra com a Europa – embora não esteja planejando iniciá-la.

“Não estamos planejando entrar em guerra com a Europa. Já falei sobre isso centenas de vezes, mas se a Europa de repente quiser entrar em guerra conosco e começar, estamos prontos agora mesmo”, disse ele na última terça-feira.

Mas o público-alvo desse tipo de demonstração de força é evidente, e o Kremlin quer garantir que os europeus fiquem abalados com essa retórica que está abalando as relações transatlânticas em suas bases.

 



Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/trump-critica-europa-e-da-vantagem-a-russia-em-negociacoes-de-paz/

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