Instalada há quase três meses, a CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) do INSS tem esbarrado na dificuldade de ouvir esclarecimentos diretos de testemunhas amparadas por habeas corpus (HCs), concedidos pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Os HCs são recursos jurídicos solicitados à Justiça. Os casos são distribuídos aleatoriamente entre os ministros do STF e podem incluir diversos tipos de solicitações, como pedidos de não comparecimento, direito ao silêncio, garantia de acompanhamento de advogados e a proibição de condução coercitiva.
Mais da metade dos convocados na CPMI fizeram uso do recurso e puderam se negar a responder parte das perguntas dos parlamentares. A comissão já ouviu 27 pessoas e 14 delas comparecerem munidas de habeas corpus.
O presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), já fez diversas críticas à concessão de HCs pelo STF. Segundo ele, esses recursos preventivos esvaziam as competências do colegiado.
Isso porque um dos diferenciais investigatórios das comissões de inquérito é justamente a possibilidade de realizar oitivas públicas, com diferentes atores na inquirição.
Viana avalia que a nova fase da operação da PF (Polícia Federal) sobre as fraudes no INSS mostrou que o habeas corpus não é uma garantia e que os convocados seguem sendo monitorados.
“A pessoa se fecha, vem com um habeas corpus aqui, diz que não tem culpa, mas quando ela sai daqui, ela começa a fazer o papel de limpeza para tentar não se culpar. E é exatamente esse monitoramento que nos ajuda a levar a investigação a cabo”, disse após a ação da PF.
Prisões da PF
Dos ouvidos pela CPMI, cinco já foram presos pela PF. Antônio Carlos Camilo Antunes Empresário, conhecido como “Careca do INSS“, decidiu prestar depoimento mesmo depois de ser detido e de ter habeas corpus que o desobrigava de comparecer no colegiado. Na última quinta-feira (13), um novo mandado de prisão contra ele foi apresentado.
Os demais presos foram:
- Rubens Oliveira Costa, empresário. Ele foi preso em flagrante em setembro durante depoimento na CPMI;
- Alessandro Antônio Stefanutto, ex-presidente do INSS;
- Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, ex-procurador-geral do INSS. Ele foi preso em Curitiba (PR) após se entregar.
- Thaisa Hoffmann Jonasson, empresária e esposa de Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho.
Ouvido na condição de convidado, o ex-presidente do INSS e ex-ministro do Trabalho e Previdência, José Carlos Oliveira, não foi preso, mas teve ordem para uso de tornozeleira eletrônica.
Também ainda está pendente de cumprimento o mandado de prisão que mira Carlos Roberto Ferreira Lopes, presidente da Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais). Ele depôs e foi preso em flagrante na CPMI, em setembro, mas foi liberado após pagar fiança.
De acordo com as investigações, a Conafer teria uma planilha de pagamento mensal de propina. Entre os beneficiados estaria Alessandro Stefanutto, com repasses mensais de até R$ 250.000.
O cunhado do presidente da Conafer, Vinícius Ramos da Cruz, foi um dos presos pela PF na quinta-feira (13). Ele é presidente do Instituto Terra e Trabalho. O depoimento dele estava previsto para 24 de novembro na CPIMI – para a oitiva, já havia recebido habeas corpus para poder ficar em silêncio.
Projeto em análise
Na CPMI, os parlamentares avaliam a apresentação de um projeto que amplia os poderes de atuação das comissões de inquérito. Uma minuta de texto já foi elaborada. Uma das motivações da proposta foi justamente os habeas corpus concedidos às testemunhas alvo de convocações, ou seja, de presença obrigatória.
Pelo texto, a comissão poderá apresentar ações ou recursos contra decisões judiciais, inclusive habeas corpus e mandados de segurança. Além disso, a proposta determina pagamento de multa para depoentes que faltarem sem justificativa.
Depoimentos pendentes
Outros convocados tiveram habeas corpus deferidos, parcial ou totalmente, e não compareceram à CPMI. É o caso de Maurício Camisotti, empresário apontado como um dos principais operadores das fraudes e um dos beneficiários finais.
Preso em 12 de setembro, Camisotti também teve decisão favorável de habeas corpus para não precisar comparecer na CPMI. O recurso foi deferido pelo ministro André Mendonça, do STF, que é o relator na Corte da ação sobre as fraudes no INSS.
Cecília Montalvão Simões, esposa e sócio de Camisotti, também teve HC deferido pelo ministro Flávio Dino, do STF, e não precisou comparecer na comissão. Ela alegou falta de recursos, por estar com bens bloqueados, para viajar para Brasília para depor.
A cúpula da CPMI ainda insiste em ouvir Camisotti e já sugeriu, inclusive, que os parlamentares da comissão possam ir à sede da PF para colher o depoimento do empresário.
A defesa de Camisotti nega que o empresário tenha envolvimento com os desvios. Também nega que ele esteja negociando um possível “acordo de delação premiada com qualquer autoridade”.
